A instrução de cães deve ser essencialmente pragmática: cada passo do exercício deve ser mostrado ao cão com a mais absoluta clareza. As repetições devem obedecer às mais rigorosas regras da coerência. O cão vai aprender suas tarefas pelo ensaio: sucesso/insucesso.
Mecanismos de aprendizagem
- Condicionamento clássico — formação de reflexos condicionados (Pavio v).
- Condicionamento instrumental — aprendizagem pelo erro/êxito — pelas próprias atividades e experiências (Konrad Lorenz).
- Aprendizagem latente — aproveitamento integral das habilidades naturais e individuais de cada animal (Paul Leyhausen).
- Aprendizagem inteligente — utilização do raciocínio conclusivo (E. Eibesfeldt).
Todo o condicionamento se realiza através de estímulos que resultam em determinadas respostas. Esses estímulos podem ser programados para a obtenção de respostas predeterminadas. Os estímulos podem ser:
- Estímulos positivos — são estímulos que produzem sensações agradáveis e provocam o desejo de que se repitam.
- Estímulos negativos — são estímulos que produzem sensações desagradáveis e provocam o desejo de que não se repitam.
- Estímulos neutros — produzem sensações de ansiedade pela omissão dum estímulo positivo ou negativo e induzem a uma iniciativa.
Métodos de condicionamento instrumental
- Treinamento por prêmio — administração de estímulos positivos.
- Treinamento por castigo — administração de estímulos negativos.
- Treinamento combinado — administração de dois estímulos positivos e negativos.
- Treinamento combinado III — administração de três estímulos positivos, negativos e mais o estímulo neutro.
Estímulos reforçadores na aprendizagem
Reforçador é todo estímulo que aumenta a possibilidade duma resposta numa situação de aprendizagem.
Em todas as formas de condicionamento são utilizados os estímulos reforçadores. O método que utilizaremos é o método combinado III, que leva o animal ao raciocínio conclusivo. Entretanto, introduziremos uma modificação filosófica de radical importância e básica para a caracterização do método Bruno Tausz, de treinamento sem castigo: é a mudança do castigo por "acidente".
Trata-se apenas duma posição filosófica: queremos que o cão aprenda pela sua própria experiência de vida; assim, teremos que nos aproximar ao máximo do seu modo de aprender no seu meio ambiente natural — a floresta, observando o comportamento de seus ancestrais — os lobos.
O método do aprendizado inteligente
A inteligência
É a capacidade de compreender, e não de aprender. É a habilidade de utilizar uma experiência vivida para resolver um problema presente e prever acontecimentos futuros. Existem cães que têm uma imensa facilidade de assimilar os exercícios, mas são incapazes de compreender uma situação nova dum mesmo exercício e realizar um exercício antigo já conhecido. Podemos citar, como exemplo, cães que sabidamente saltam mais de um metro de altura em sua casa e, numa prova oficial cujo obstáculo é de um metro, se recusam a saltar.
Quociente de inteligência
QI — é um número que representa o nível da capacidade dum indivíduo de prever acontecimentos ou situações futuras, utilizando o raciocínio lógico, com base em experiências anteriores.
A diferença entre o aprendizado humano e o aprendizado animal
Nós, humanos, chamados civilizados e racionais, somos participantes duma sociedade normativa que ensina, que erra, que ama, que odeia, que responsabiliza, que promete, que ameaça, que proíbe, que trai, que coage, que domina, que suborna e é subornada, que culpa, que julga, que encarcera, que tortura, que mata por prazer, que compete pelo prazer de competir, enfim, que possui, graças à sua inteligência privilegiada entre todos os animais, certas características de comportamento exclusivas, embora seus instintos primordiais permaneçam os mesmos e iguais a todos os outros animais.
Por causa dessas características, essa sociedade normativa e proibidora cria normas de conduta e listagens de itens proibidos: um regulamento nada mais é do que uma lista do que não se pode fazer; o Código Penal é uma relação de crimes previstos por lei; o Código de Trânsito é uma listagem numerada em artigos, parágrafos e itens de infrações. Até os Dez Mandamentos começam pela palavra NÃO.
É muito difícil, para o humano, mudar essa ideia. Nós mesmos, ao invés de aprendermos a dizer "Mamãe", a primeira coisa que aprendemos foi "Não, nené!", "Não pode!"
Esses exemplos mostram apenas a diferença.. ., a total, brutal e radical diferença na forma de aprendizado entre animais e seres humanos.
Um animal nunca ensina outro animal. Cada um aprende pela sua própria experiência. (O homem também gosta de quebrar a cara sozinho, só que papai e mamãe não deixam.)
Entre os animais, ditos selvagens, nenhum deles castiga o outro; portanto, desconhecem, absolutamente, o teor real da punição. Eles não conseguem se sentir ameaçados por uma promessa de supressão da alimentação ou duma pancada, se voltarem a repetir um erro. As penas não existem, muito menos a pena de morte. Os animais só matam para se defender, para se alimentar ou pela disputa duma liderança ou um acasalamento.
Aliás, erro é outro termo exclusivo da humanidade. Os animais não erram e, portanto, nunca merecem castigo. Eles são sempre responsáveis por todos os seus atos. Se não erram, também não sentem culpa. Se não têm sentimentos de culpa, não têm neuroses... e por aí vai.
Se um filhote sobe num tronco, ali não terá uma mãe que vai gritar: "Desça já daí, menino! Você vai se machucar!"
O filhote cai enquanto aprende os primeiros passos/assim como aprende gradativamente a avaliar as consequências dum tombo. Se não aprende as lições, morre. Portanto, tem que ficar logo esperto.
Entre os humanos, podemos perceber que um "pivete" ou "trombadinha" (como chamamos aqueles menores abandonados que têm de se arranjar sozinhos), de seis para sete anos, já consegue sua própria comida roubando, como fazem os animais, pedindo e até trabalhando, enquanto um menino educado não sabe nem vestir suas próprias calças sem a ajuda da mãe. Um índio de sete anos já caça e executa trabalhos comunitários.
Se um cão é picado por uma formiga ao cheirar um formigueiro, não se sentirá culpado nem muito menos fugirá cada vez que vir formigas. Só que, na próxima vez que sentir o cheiro de formigas, não mais chegará perto.
Assim, os animais, desconhecendo o lapso de tempo, não se sentem ameaçados para castigos futuros. As ameaças que amedrontam os animais são as ameaças presentes: o rosnado, a apresentação dos dentes, os rituais de liderança e submissão etc.
Se um animal não erra, ou seja, se suas atitudes não estão relacionadas em nenhuma lista de pecados, ele não tem sentimentos de culpa. Um animal não se sente culpado por ter matado outro animal para se alimentar, assim como nós não nos sentimos culpados pelo assassinato duma galinha para o almoço. Entretanto, se matarmos um cachorro para comer, a Sociedade Protetora dos Cachorros, digo, dos Animais, provavelmente armará uma enorme campanha contra. Matar outro ser humano para comer daria manchetes em todos os jornais do mundo e até filme.
Nós, humanos, pelo contrário, costumamos até substabelecer as culpas. Por exemplo: se estamos passeando e começa a chover, substabelecemos a culpa no azar; mas, se alguém joga um balde d'água pela janela, nós iremos descobrir o culpado, cobrar-lhe um tributo e, mais, consideraremos o fato como pessoal.
Um estímulo negativo jamais deverá assumir a forma duma penalidade tributada a um cão por um erro cometido.
Quando espetarmos um dedo por acidente, tentaremos evitar que aquela situação se repita, tomando mais cuidado, mas o fator medo fica excluído.
Se alguém prepara uma injeção, nós nos preparamos para ser espetados. Aí, entra o fator medo, que impede que aceitemos a espetada, mesmo sabendo que vai nos curar. É por isto que a maioria das pessoas tem medo de dentista.
Qualquer que seja o método adotado, deve-se exigir rigor na posologia, na oportunidade e na precisão da administração dos estímulos.
A clareza na apresentação das tarefas é um dos fatores determinantes da rapidez nas respostas. O medo é um fator inibidor do raciocínio e da atenção e, portanto, deve ser excluído dentre os fatores que, possivelmente, determinariam a obediência. Tecnicamente, deve-se provocar situações que induzam o cão a se comportar da maneira por nós determinada, mas que ele tenha a sensação de que a decisão foi dele. Todo o programa de estímulos deverá ser muito bem administrado.
As repetições dos estímulos devem ser programadas sempre dentro das mesmas condições do momento em que o exercício foi apresentado.
Se entendermos como erro uma atitude canina que consideramos fora dos nossos parâmetros de conduta, devemos corrigir um "erro" com um estímulo negativo que assuma características de acidente.
Quando um estímulo negativo for aplicado por meio duma atitude nossa, um tranco, por exemplo, esse tranco deverá assumir características de involuntariedade. Como se o cão, com seu "erro", provocasse um acidente involuntário nosso, para o qual pedimos imediatas desculpas. Com essa atitude o cão não associará o tranco ao instrutor zangado, mas pensará que aquele "erro" provocou um acidente.
Para podermos compreender mais profundamente a relação que o nosso cão tem conosco, é absolutamente necessário que tenhamos um conhecimento mais amplo da etologia — a ciência que estuda o comportamento animal no seu meio ambiente e sem a interferência do ser humano.
Resumindo: Os animais desconhecem o significado do castigo por não aplicarem essa modalidade de comportamento entre si. Desconhecem o significado da ameaça como forma de coação, pois as atitudes agressivas, na sua estrutura ética, são sempre deflagradas pelos instintos primordiais. Desconhecem, ainda, o julgamento como forma de avaliação das faltas e dos pecados. Assim, castigar um cão por um comportamento que julgamos em desacordo com as nossas normas de conduta é absolutamente ineficiente como técnica didática.
Um cão jamais poderá supor que estaria apanhando por ter feito coco, como também jamais irá imaginar que estaria recebendo carinho por bom comportamento.
Os animais aprendem pelo ensaio: sucesso/insucesso. O nosso método baseia-se em criar uma série de situações de aprendizado, nas quais os animais terão sucesso ou insucesso previamente programados.
Nossa principal ferramenta de trabalho será a nossa inteligência. Com ela utilizaremos nossa criatividade para montar uma coreografia, na qual os cães decidirão comportar-se de acordo com o programa, sem a necessidade de emitirmos ordens ameaçadoras.
O humano comporta-se corretamente por medo de errar. O castigo por um erro cometido varia desde o desprezo dos companheiros até a pena de morte supervisionada e que visa servir de exemplo para os demais.
Os animais não se comportam de forma correta ou errada, mas, de acordo com a sua experiência, decidem pelo comportamento menos arriscado possível.
É absolutamente inútil reunir todos os cães da casa e matar um companheiro "em praça pública" para que os outros não incorram no mesmo erro.
O uso da violência é um atestado da nossa incapacidade de argumentar. Reconhecemos a fragilidade dos nossos argumentos ou que os argumentos do aprendiz foram mais fortes, o que vem dar no mesmo. Sempre que a violência é utilizada destruímos boa parte do nosso trabalho anterior.
Uma análise rica do comportamento do cão, a concentração prévia e a meditação, a preparação psicológica, o estudo da coreografia para as nossas atitudes de acordo com as reações de cada cão e a passagem para um estado de calma constituem a estrutura necessária para um relacionamento consciente, seguro e isento de emoções. São as condições básicas para o sucesso do treinamento.
Estamos começando a estabelecer um código de linguagem entre o instrutor e o cão: o estímulo positivo significa sim e o estímulo negativo significa não.
Agora podemos pensar em "programar" o nosso aluno.
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